Ela tatuou-se toda. A pele sangrando pouco importava. Valia mesmo o prazer da dor que sabia causaria nele.
Sentia na boca o açúcar do doce sabor da vingança.
sábado, 15 de dezembro de 2007
terça-feira, 13 de novembro de 2007
Anos-luz
Outubro foi embora. Corri atrás. Não alcancei.
Estou voando junto com novembro. E sei que dezembro já passou.
Será que é preciso ter 50 pra se arrepender de não ter segurado forte cada segundo, de cada minuto, de cada hora, de cada dia, destes anos todos que escorreram pelos meus dedos?
Estou voando junto com novembro. E sei que dezembro já passou.
Será que é preciso ter 50 pra se arrepender de não ter segurado forte cada segundo, de cada minuto, de cada hora, de cada dia, destes anos todos que escorreram pelos meus dedos?
sexta-feira, 21 de setembro de 2007
Ooops!
Paris é um deslumbre. Mas dá muito trabalho.
Pra quem vai com a grana contada então, nem se fale!
Um grande exercício mental é fazer seu roteiro do dia usando o metrô.
Pegue o mapa e estude pacientemente onde você está, para onde quer ir, qual o sentido do trem que vai pegar e quais são as baldeações.
Tá tudo muito bem explicado. Não precisa falar inglês nem francês.
É fácil se orientar pelas cores das linhas. Legal. Mas que cansa, cansa.
Ela refletia sobre seu esforço, só pra justificar aquele mico.
Lembra que saíra logo cedo do Ibis Paris Gare Montparnasse e andara um pouco pra trás, pra acessar a Estação Pernety, da linha azul. Seu destino, Trocaderó -adora o nome da estação que dá na Tour Eiffel.
Bastava seguir na mesma linha, no sentido Saint-Denis.
Fácil. Podia relaxar e observar os franceses e seus cães, dentro das composições, sem cerimônia.
Os cães muito educados. Mas sérios como seus donos.
Sacolejava de pé, apoiando a cabeça no peito do companheiro, quando deitou os olhos numa moça que se afundava na leitura de um romance.
Feliz por reconhecer seu idioma no título do livro, tentou puxar assunto: “Você gosta de Paulo Coelho?”.
Jamais vai esquecer aquele olhar que a fuzilou: “Não li e não gostei”. A moça-estilo-intelectual-faço-curso-na-Sorbonne exibiu, raivosa, a capa vermelha, aproximando-a dos olhos da sua interlocutora, que enrubesceu violentamente.
As letras douradas pularam na sua cara: era “O Alienista” e não “O Alquimista”.
Do alto da torre, olhava os telhados cinzas de Paris, mas não conseguia parar de pensar que pagara em dobro o sarro que tirara do marido. Embora versado no francês, ele dera uma bela escorregada. E agora, atribuiria o mico ao estresse da elaboração do roteiro ou ao astigmatismo que seus óculos teimavam em não corrigir?
Trinta anos depois, em letras douradas sobre o mármore negro, seu epitáfio clamava:
Juro que não li Paulo Coelho.
1955-2025
Pra quem vai com a grana contada então, nem se fale!
Um grande exercício mental é fazer seu roteiro do dia usando o metrô.
Pegue o mapa e estude pacientemente onde você está, para onde quer ir, qual o sentido do trem que vai pegar e quais são as baldeações.
Tá tudo muito bem explicado. Não precisa falar inglês nem francês.
É fácil se orientar pelas cores das linhas. Legal. Mas que cansa, cansa.
Ela refletia sobre seu esforço, só pra justificar aquele mico.
Lembra que saíra logo cedo do Ibis Paris Gare Montparnasse e andara um pouco pra trás, pra acessar a Estação Pernety, da linha azul. Seu destino, Trocaderó -adora o nome da estação que dá na Tour Eiffel.
Bastava seguir na mesma linha, no sentido Saint-Denis.
Fácil. Podia relaxar e observar os franceses e seus cães, dentro das composições, sem cerimônia.
Os cães muito educados. Mas sérios como seus donos.
Sacolejava de pé, apoiando a cabeça no peito do companheiro, quando deitou os olhos numa moça que se afundava na leitura de um romance.
Feliz por reconhecer seu idioma no título do livro, tentou puxar assunto: “Você gosta de Paulo Coelho?”.
Jamais vai esquecer aquele olhar que a fuzilou: “Não li e não gostei”. A moça-estilo-intelectual-faço-curso-na-Sorbonne exibiu, raivosa, a capa vermelha, aproximando-a dos olhos da sua interlocutora, que enrubesceu violentamente.
As letras douradas pularam na sua cara: era “O Alienista” e não “O Alquimista”.
Do alto da torre, olhava os telhados cinzas de Paris, mas não conseguia parar de pensar que pagara em dobro o sarro que tirara do marido. Embora versado no francês, ele dera uma bela escorregada. E agora, atribuiria o mico ao estresse da elaboração do roteiro ou ao astigmatismo que seus óculos teimavam em não corrigir?
Trinta anos depois, em letras douradas sobre o mármore negro, seu epitáfio clamava:
Juro que não li Paulo Coelho.
1955-2025
sábado, 8 de setembro de 2007
Cem SentidoS
Um arrepio de frio. Meus braços se entrelaçam.
Aquela luz agride meus olhos.
Um gosto amargo desce do céu da boca e pára na garganta.
Cubro minhas orelhas (quem sabe, assim, o barulho diminui).
O cheiro de bosta me faz vomitar.
Acordo, assustada.
Você me envolve delicadamente em teus braços.
Vejo dentro dos teus olhos esse amor sem fim.
Teu beijo ainda sabe a café.
Tua voz pede que eu me acalme.
Pela janela do quarto chega um cheiro de jasmim.
Te abraço.
E volto a dormir.
Aquela luz agride meus olhos.
Um gosto amargo desce do céu da boca e pára na garganta.
Cubro minhas orelhas (quem sabe, assim, o barulho diminui).
O cheiro de bosta me faz vomitar.
Acordo, assustada.
Você me envolve delicadamente em teus braços.
Vejo dentro dos teus olhos esse amor sem fim.
Teu beijo ainda sabe a café.
Tua voz pede que eu me acalme.
Pela janela do quarto chega um cheiro de jasmim.
Te abraço.
E volto a dormir.
quinta-feira, 23 de agosto de 2007
Clodô e Clésio*
Ela não tá nem aí. Podem chamá-la de brega. Não, esta noite ela não vai ouvir Caetano. Despudorada, dirá que considera João Gilberto um chato. E achará graça da expressão horrorizada que tomará conta da amiga jorrrnalixxssssssssta.
Passa a mão sob a agulha do velho toca-discos: -“Parece que ainda funciona”. Olha a bolacha preta pra ver se não tem nenhum risco. E sorri, feliz como há muito não se sentia.
Pega uma caixa de lenços que secarão suas lágrimas.
Fagner gorjeia e se revela só pra ela:
“Um dia vestido/De saudade viva/Faz ressuscitar
Casas mal vividas/Camas repartidas/Faz-se revelar
Quando a gente tenta/De toda maneira/Dele se guardar
Sentimento ilhado/Morto, amordaçado/Volta a incomodar”
*autores de Revelação
Passa a mão sob a agulha do velho toca-discos: -“Parece que ainda funciona”. Olha a bolacha preta pra ver se não tem nenhum risco. E sorri, feliz como há muito não se sentia.
Pega uma caixa de lenços que secarão suas lágrimas.
Fagner gorjeia e se revela só pra ela:
“Um dia vestido/De saudade viva/Faz ressuscitar
Casas mal vividas/Camas repartidas/Faz-se revelar
Quando a gente tenta/De toda maneira/Dele se guardar
Sentimento ilhado/Morto, amordaçado/Volta a incomodar”
*autores de Revelação
sexta-feira, 10 de agosto de 2007
Comida
Passa a vida temendo as baratas. Num desses dias, o pensamento voa longe. Tão longe que chega na morte.
- "Se eu morrer antes do que você, me promete uma coisa? Jura, por favor, que serei cremada? Não quero ser coberta pelas baratas... Aí, depois, pegue minhas cinzas e, diariamente, misture uma colher dos meus restos na tua comida. Quando o saco ficar vazio, você pode morrer, tá?".
Comida até depois da morte.
- "Se eu morrer antes do que você, me promete uma coisa? Jura, por favor, que serei cremada? Não quero ser coberta pelas baratas... Aí, depois, pegue minhas cinzas e, diariamente, misture uma colher dos meus restos na tua comida. Quando o saco ficar vazio, você pode morrer, tá?".
Comida até depois da morte.
terça-feira, 31 de julho de 2007
Num átimo
"Lembra? Ah, foi tão bom. Que saudade! Nossa, você não mudou nada!"
Era uma simples reunião de amigos. Tá certo, não se viam há muito tempo. Nada mais natural que o papo soasse a naftalina. A inconstância desses encontros faziam-nos especiais. Estava implícito: entrelaçariam suas lembranças, mas, ao ultrapassar a soleira da porta, já na madrugada fria, retornariam a suas vidas, que em nada lembravam aquele passado.
Vale mesmo por aquele instante que suspende o correr do tempo e deixa olhares emocionados se cruzarem e vozes embargadas declamar poesias há muito esquecidas.
Era uma simples reunião de amigos. Tá certo, não se viam há muito tempo. Nada mais natural que o papo soasse a naftalina. A inconstância desses encontros faziam-nos especiais. Estava implícito: entrelaçariam suas lembranças, mas, ao ultrapassar a soleira da porta, já na madrugada fria, retornariam a suas vidas, que em nada lembravam aquele passado.
Vale mesmo por aquele instante que suspende o correr do tempo e deixa olhares emocionados se cruzarem e vozes embargadas declamar poesias há muito esquecidas.
sexta-feira, 20 de julho de 2007
JJ 3054
Top Top. Toma! Engulam! A câmera flagra os gestos obscenos. Autoridades comemoram: a causa do acidente foi problema mecânico no avião. Ufa, que alívio. Oba! Um a zero no round entre situação e oposição.
Enquanto isso na aviação civil...entrega de obras incompletas, superfaturadas, baixos salários dos controladores, equipamentos sucateados e/ou obsoletos, overbooking, superlotação da malha aérea, horas extras abusivas dos pilotos para evitar novas contratações.
Tudo como dantes no quartel de Abrantes.
Enquanto isso na aviação civil...entrega de obras incompletas, superfaturadas, baixos salários dos controladores, equipamentos sucateados e/ou obsoletos, overbooking, superlotação da malha aérea, horas extras abusivas dos pilotos para evitar novas contratações.
Tudo como dantes no quartel de Abrantes.
sexta-feira, 13 de julho de 2007
Chico
Todo dia ela faz tudo sempre igual. Acorda, escova os dentes, engole os remédios com o café. Folheia o jornal. Põe a roupa sem olhar o espelho. Dá o beijo pontual no marido. Vai pro escritório. Passa o dia com raiva do mundo. Volta pra casa. Joga-se no sofá. As imagens da TV são hipnóticas. Marido chega e debruça-se para o beijo pontual. Jantam. Hipnotizam-se. Vão pra cama.
Hoje o mar está vermelho. A barriga inchada e seios doloridos. Tensão. Levanta, escova os dentes. Põe a roupa e olha pro espelho. Dá um sorriso. Sai sem se despedir.
Nunca mais se ouviu falar dela.
Hoje o mar está vermelho. A barriga inchada e seios doloridos. Tensão. Levanta, escova os dentes. Põe a roupa e olha pro espelho. Dá um sorriso. Sai sem se despedir.
Nunca mais se ouviu falar dela.
terça-feira, 10 de julho de 2007
Sem espaço
Foi deitar pra ver se acalmava seu coração. A cabeça em ebulição parecia conter milhões de pensamentos, que a levavam a sensações das mais variadas. E elas disputavam entre si o espaço para dominá-la.
A cama não ajudou em nada. Levantou, vestiu um roupão e foi remexer na velha caixa abandonada no quartinho do quintal.
Meteu a mão entre os papéis, pegou o caderno vermelho e abriu: lá estava o texto que escrevera 35 anos antes, numa dessas noites quando a cabeça parecia explodir e os pensamentos e sensações faziam seu coração pulsar a 195 bpm.
A cama não ajudou em nada. Levantou, vestiu um roupão e foi remexer na velha caixa abandonada no quartinho do quintal.
Meteu a mão entre os papéis, pegou o caderno vermelho e abriu: lá estava o texto que escrevera 35 anos antes, numa dessas noites quando a cabeça parecia explodir e os pensamentos e sensações faziam seu coração pulsar a 195 bpm.
quinta-feira, 5 de julho de 2007
Cartão de crédito
Ela chegava a ser considerada "pão-dura". Para incredulidade de algumas amigas, recusava roupas oferecidas pelo marido – “Não preciso disso agora”.
A fatura do cartão continha apenas o que para ela era estritamente necessário: assinatura do jornal, seguro de vida e a taxa por perda ou roubo.
Um dia, resolveu tomar um moderador de apetite. Precisava perder alguns quilos. O médico alertara - ficaria um pouco eufórica.
O marido nem acreditou. Sob efeito do medicamento, comprou um carro zero.
Afundou-se em dívidas.
A fatura do cartão continha apenas o que para ela era estritamente necessário: assinatura do jornal, seguro de vida e a taxa por perda ou roubo.
Um dia, resolveu tomar um moderador de apetite. Precisava perder alguns quilos. O médico alertara - ficaria um pouco eufórica.
O marido nem acreditou. Sob efeito do medicamento, comprou um carro zero.
Afundou-se em dívidas.
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